Curso TPS 2009 SIC

Curso de Técnicas de Protecção e Segurança 2009

01/07/2008

AS GLOCK do MAI 1

Por Luís Pereira, mais um grande artigo, desta feita acerca de uma arma que dispensa qualquer apresentação, mas que merece ser discutida e rediscutida por forma a que não nos esqueçamos do que são feitas as coisas boas!

As Glock do MAI

Vai para 28 anitos que Gaston Glock apresenta uma pistola no concurso para escolha de uma arma para o exército austríaco.

A arma era relativamente original, apresentando cerca de 40% dos componentes em plástico.

Era uma pistola relativamente grande, com travamento por curto recuo do cano tipo Browning/Peters, com rampa de alimentação e câmara não suportada.

Funcionava com um percutor de agulha lançado.

Tinha um sistema de gatilho denominado "Safe Action", no qual ao ser introduzida a munição na câmara, o percutor ficava armado cerca de 1/3 do seu percurso, armando o restante ao ser premido o gatilho para disparar.

Não tinha nenhuma patilha de segurança exterior, possuindo apenas três sistemas de segurança internos, sendo o primeiro uma trava no gatilho accionada pelo dedo do atirador, o segundo um bloqueio do percutor accionado por uma bossa na alavanca intermediária de disparo, e o terceiro uma segurança contra quedas montada directamente sob o armador.

O carregador bifilar para 17 munições e o calibre 9x19mm tornam-a uma verdadeira “wondernine”!




Para muitos essa arma era o futuro, para outros era "mais uma arma"...

Hoje, passadas quase três décadas após a adopção da "P-80" (designação militar da Glock 17 na Áustria) em 1982 pelas forças armadas e corpos de polícia austríacos, o debate ainda não acabou.

Na realidade, não só a arma foi evoluindo e amadurecendo, como os seus detractores e alguns cérebros iluminados ainda continuam a inventar, esgrimindo ideias e pesadelos.

Admito que, atendendo á minha auto-formação inicial em armamento e seguinte formação profissional na Força Aérea, também eu torci o nariz a uma arma sem um "pinchavelho de segurança" pendurado algures!

Após algum estudo e ter tido a sorte de ver uma ao vivo e ter a oportunidade de a experimentar, mudei de ideia e aderi ao "Safe Action", elegendo a minha arma de eleição.

Com a minha própria evolução, fui mudando de ideias no que respeita a uma série de coisas.

As GLOCK do MAI 2

Assim, não consigo (ou infelizmente, até consigo...) compreender a ideia peregrina de alguém querer montar uma patilha de segurança externa actuada pelo operador numa arma que seja perfeitamente segura.

Sei que em meados da década de 80', as forças policiais da Tasmânia, do Paquistão, alguns grupos de segurança israelitas e algumas corporações policiais sul-americanas quiseram as suas Glock equipadas com patilhas de segurança.

Em resposta a esta necessidade, Joe Cominolli introduziu no mercado um conjunto de gatilho com patilha de segurança exterior para ser vendido "after market",acompanhado por uma ferramenta para recortar a carcaça e assim permitir a montagem do conjunto.





Essas armas são vulgarmente designadas de 17S, muito embora não tenham o "S" gravado na arma e desconheço se alteração foi efectuada na própria Glock ou se á posteriori.

Da mesma forma, o NYPD também achou que, muito embora a arma fosse excelente, o sistema de gatilho não seria muito seguro nas mãos do comum dos polícias de giro, tendo a própria Glock introduzido o "New York Trigger" que aumenta o peso do gatilho para o de um revólver.





As Glock do MAI 3

Com isto tudo, chegamos a Portugal em pleno século XXI, quando o MAI resolve abrir um concurso para o fornecimento de uma nova arma para equipar as suas polícias.

Foi apresentado um caderno de quesitos, as marcas concorreram e apresentaram as suas armas para teste.

Para não variar, a Glock 19 varreu literalmente a concorrência, quer pela sua qualidade, quer pelo seu preço imbatível.

Mas... de repente, já a meio do concurso, alguma alma iluminada lembra-se de introduzir um novo quesito: a arma a ser fornecida, tinha obrigatoriamente de possuir uma patilha de segurança externa!



Não que eu tenha alguma coisa contra a evolução... antes pelo contrário!

Mas sou muito parcial contra esta segurança em termos de ergonomia: em situações de stress (deixemos-nos de tretas, de medo mesmo!), pela análise das fotografias que se vão apanhando por aí, em minha opinião os operadores estão sujeitos a ejectar o carregador quando quiserem colocar a patilha de segurança na posição de fogo.

Por outro lado, pode acontecer o operador ficar a lutar contra o botão da patilha de segurança, quando quiserem fazer uma troca de carregador...

Isto tudo, exclusivamente porque é muito mais fácil fazer o pedido estúpido de uma patilha de segurança que não faz falta nenhuma, do que ensinar os operadores a utilizar as armas em segurança.



Claro que estes não foram os únicos iluminados… basta ver a quantidade de “coisas” para a Glock que aí andam, como sejam os “Saf-T-Block”, os “Side LockSafety Trigger”, e tantas outras cangalhas que aparecem no sentido de se ganhar umas lecas, a troco de um sentimento de segurança física que na realidade não existe.

Quanto ao ser uma arma revolucionária… bem… desculpem-me os puristas, mas não o era e continua a não o ser!

A carcaça integralmente em plástico remonta á velhinha Heckler & Koch VP70 concebida em 1968 e comercializada em 1970, sendo também uma das primeiras pistolas modernas sem qualquer patilha de segurança externa.

O sistema de travamento Browning com rampa de travamento já vem da Hi-Power em finais da década de 20’, e o travamento por bloco na janela de ejecção da Peters também é da década de 50’.

Já o sistema do gatilho remonta ás velhinhas pistolas Roth Steyr do exército austro-húngaro, de 1907.

Assim, afinal, o que é a Glock?

É simplesmente a reunião de uma série de boas ideias devidamente redesenhadas e incorporadas numa única arma que será, digam lá o que disserem, uma das melhores armas de fogo de sempre.